Odeio a ideia de que uma pintura é um rectângulo que
está fixo.
Robert Rauschenberg
BED,
1955
A Cama de
Robert Rauschenberg encontra-se no quarto andar do Museu de Arte Moderna, em
Nova Iorque, numa das galerias dedicadas tanto à pintura como à escultura.
A Cama é, literalmente,
uma cama. Na sua estrutura física, visual e concetual. Dentro de uma moldura de madeira lisa foi
esticado um lençol branco, servindo de superfície tanto para indicar um colchão
como para servir de tela à obra. Na parte superior da tela ou cabeceira da cama
foi colocada uma almofada também branca. Uma colcha de retalhos dobrada ao meio
ocupa dois terços da obra, desde a almofada até “aos pés da cama”. No topo a
colcha faz uns drapeados, umas dobras para dentro e para fora, marcando uma
linha ligeiramente diagonal. O padrão da colcha é modular, tipo patchwork, com quadrados e linhas de
várias cores e com três barras lisas à volta, uma vermelha, outra amarela e
outra vermelha. Saliento o facto das cores aqui referenciadas não serem as
exatas, devido à forte possibilidade de terem desbotado.
Na Cama,
Rauschenberg fundiu objetos do quotidiano com um certo gestualismo pictórico. A
obra parece-me dividida em três partes ou secções mais ou menos iguais. A da
cabeceira, a do corpo e a dos pés da cama. De cima para baixo, a primeira
secção é também ela dividida por uma linha horizontal que atravessa a almofada.
O topo está riscado com vários traços a lápis em todas as direções. A secção do
meio foi “palco” de muitas intervenções: da modelação da colcha, das pinceladas
de tinta de várias cores (azuis, castanhos, vermelhos, verdes, amarelos, pretos
e brancos), dos escorridos de tinta branca e vermelha, da textura… A secção de
baixo ainda salpicos de tinta branca remetem para várias leituras.
A cama está remexida, entreaberta, proporcionando uma
narrativa ao observador. A Cama não
sendo cama, não deixa de estar associada ao sono, aos sonhos, à doença, ao
sexo, aos momentos mais íntimos da vida.
Pintura diz respeito tanto à arte como à vida… Eu
tento atuar nessa lacuna entre as duas.
Robert
Rauschenberg
Para Robert
Rauschenberg a pintura relacionava-se com a arte e com a vida, por isso
procurou agir sempre entre estes dois polos. Talvez a história da Cama de Rauschenberg seja verdade: certo
dia ao acordar com vontade de pintar, sem dinheiro para comprar telas, decidiu
“pintar a manta”. Usou tinta, lápis, até mesmo pasta de dentes e verniz das
unhas. Talvez a colcha da Cama de
Rauschenberg tenha sido mesmo um objeto do seu uso quotidiano, tornando a obra
pessoal e íntima como um autorretrato. Assim, mesmo tendo perdido a sua função,
talvez ela ainda possa estar relacionada com a intimidade de Rauschenberg. Mas
é apenas um “talvez” no mundo das possibilidades.
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